MARIO CRAVO NETO
Mario
Cravo Neto nasce em 20 de Abril de 1947 na cidade do Salvador, Bahia,
onde no ano de 2009, em 09 de agosto, partiu para o lugar que estava
reservado para ele no plano desconhecido da existencia, ainda que
continue hoje a viver entre nós em espirito e o seu legado artistico
continuará sendo sempre o trabalho de um dos grandes artistas
contemporâneos.
Em 1964, aos 17 anos, muda-se para a Alemanha,
quando seu pai, o escultor Mario Cravo Jr., participa do programa
Artists in Residence, em Berlim. É naquele período que Cravo Neto dá
início as suas experiências com escultura e fotografia. No ano de 1965
retorna ao Brasil, é premiado na I Bienal de Artes Plásticas da Bahia e,
ainda naquele ano, faz sua primeira exposição individual. Entre 1968 e
1970, vive em Nova Iorque, onde estuda na Art Student League, sob a
orientação do artista plástico Jack Krueger, um dos precursores da arte
conceitual. Em 1970 publica sua primeira fotografia fora do Brasil no
catálogo da exposição Information, Museu de Arte Moderna de Nova Iorque.
Ainda em Nova Iorque produz a série de fotografias em cores intitulada
On the Subway, publicada na revista Camara 35, e fotografias em
preto-e-branco que abordam o aspecto da solidão humana na grande
metrópole. É em seu estúdio no Soho que desenvolve, paralelamente à
fotografia, as esculturas em acrílico baseadas no processo do
“terrarium”, envolvendo o crescimento de plantas vivas em ambientes
fechados. Na XI Bienal Internacional de São Paulo, em 1971, em sala
especial, apresenta pela primeira vez a instalação das esculturas vivas
produzidas em Nova York e recebe o Prêmio de Escultura Governador do
Estado de São Paulo. Durante os anos de 1971 a 1974, dedica-se à criação
de projetos “em sítio” (land art), interferindo diretamente na natureza
do sertão baiano e no perímetro urbano de sua cidade natal. A
documentação sistemática desses trabalhos lhe proporciona intimidade com
a linguagem cinematográfica. É nesse contexto que realiza diversos
curtas-metragens e que, em 1976, recebe o Prêmio Nacional da Embrafilme,
pela direção de fotografia do longa-metragem Ubirajara, do diretor
André Luis Oliveira. Em razão de um acidente automobilístico, em 31 de
março de 1975, é forçado a permanecer com ambas as pernas imobilizadas
por um ano. Esta circunstância, porém, não interrompe sua produção.
Nesse período trabalha em maquetes de seus projetos tridimensionais e
volta a sua atenção para o retrato em estúdio, para a apropriação de
objetos e para a utilização desses objetos em suas instalações e nas
composições das fotografias. Surge assim um trabalho único, autoral, no
qual Cravo Neto cria, a partir da integração que promove entre
personagem e objeto, o que podemos chamar de fotografias-esculturas em
preto-e-branco. São dessa fase o Ninho de Fiberglass, 1977, e Câmaras
Queimadas, 1977, criações emblemáticas, expostas respectivamente nas XIV
e XVII Bienal Internacional de São Paulo. Essas obras são mais tarde
comentadas por Edward Leffingwell, no prefácio do livro The Ethernal
Now, 2002, a mais completa monografia de Mário Cravo Neto, contendo 136
fotografias em preto-e-branco em estúdio. Nas palavras de Lefingwell, “o
elo principal dentre os projetos citados, as instalações que se
seguiram e as fotografias que o tornaram conhecido, foi a apresentação
de um translúcido ninho feito com filamentos de fiberglass, catados por
algum arquiteto desconhecido: uma ave da vizinhança de seu estúdio na
Cidade do Salvador”.
Mesmo
antes da publicação do The Eternal Now, as fotografias em preto-e-branco
são amplamente mostradas em diversas exposições e editadas em vários
livros e catálogos. Das várias exposições, destacam-se: em 1988, Pallazo
Fortuny, Veneza; em 1992, Witkin Gallery, Nova Iorque e Houston
FotoFest, Houston; em 1995, Museu de Arte de São Paulo, São Paulo; em
1998, Fahey Klein Gallery, Los Angeles e Photo España, Real Jardín
Botânico de Madrid, quando o artista mostrou impressões fotográficas em
grande formato, expostas ao ar livre.
Em 1994
publica Mario Cravo Neto, Edition Stemmle, Zürich, que acompanha uma
exposição individual no Frankfurter Kunstverein, Frankfurt, com
curadoria e edição de Peter Weiermair, sendo seu primeiro livro com
fotografias em preto-e-branco editado fora do Brasil. No ano de 2000
viaja à Dinamarca a convite de Tove Thage, diretora do
Nationalhistoriske Museum på Frederiksborg, Hillerød, para fotografar os
mais importantes coreógrafos e bailarinos do Danish Royal Ballet e
realizar uma exposição no mesmo museu. Simultaneamente à produção em
estúdio, Cravo Neto vive e retrata em cores sua cidade, Salvador, terra
do sangue misturado, onde convivem santos católicos e deuses da África —
a cidade do São Salvador da Baía de Todos os Santos — território único e
farto que instiga o artista e é tema de sete dos seus livros,
publicados entre 1980 e 2000. Desses livros, os mais significativos são:
Cravo, Áries Editora, 1983, “Mario Cravo Júnior visto por Mario Cravo
Neto representa uma realização plástica e interpretativa das mais
sensíveis como livro de fotografia de esculturas.” (MCJ); Exvoto, Áries
Editora, Salvador, 1986, livro que retrata os ex-votos do sertão baiano,
objetos oferecidos aos santos em gratidão a graças alcançadas;
Salvador, Áries Editora, Salvador, 1999, íntimo retrato de sua cidade e
Laroyé, Áries Editora, Salvador, 2000, onde Exu é o cenário encarnado
nos corpos em movimento, livro oferenda ao polêmico personagem mítico da
cultura africana. “Esú, baía do corpo, navio solitário, atracado em
todos nós.” (MCN)
Algumas
viagens marcam especialmente a produção de Cravo Neto, seja de maneira
objetiva, gerando um livro ou uma mostra, seja de maneira subjetiva,
fazendo conexões entre os mundos interior e exterior, fronteira que não
se estabelece no seu trabalho. A experiência de um mês a bordo de um
navio-hospital da Marinha do Brasil no rio Solimões, Amazônia em 1990,
ou mesmo a ida a Luanda, Angola, para produzir as fotografias do livro
Angola e a Expressão da sua Cultura Material, FEO, Salvador, 1991, que
lhe pôs em contato com o acervo do Museu Nacional de Antropologia de
Angola, certamente fazem parte do percurso que o leva, em 1998, ao
interior dos terreiros. É a partir desse ano que Cravo Neto se aproxima
do culto afro-baiano e, por sete anos consecutivos, se dedica a
fotografar e gravar em vídeo a vida e os rituais do culto, em especial
do terreiro Ilé Àse Ópó Aganju. Dessa fase o artista publica três
livros, em todos fazendo uso da composição mista de imagens em cor e em
preto-e-branco para abordar, com a densidade de um iniciado, a
religiosidade afro-baiana. Em 2003, apresenta a instalação e o livro Na
Terra Sob Meus Pés, CCBB — Rio de Janeiro, com curadoria de Ligia
Canongia. Trance-Territories, Verlag Das Wunderhorn Heidelberg, 2004,
livro e instalação integram a mostra Black Gods in Exile de Pierre
Verger no Dahlen Ethnologisches Museum, Berlin, curadoria de Michael
Toss. E o seu mais recente livro, O Tigre do Dahomey – A Serpente de
Whydah, Áries Editora, Salvador, 2004, editado por ocasião da mostra de
inauguração do novo espaço da Paulo Darzé Galeria de Arte, Salvador, e
posteriormente exibido no Museu Afro-Brasil, São Paulo, em 2005. “Viver é
sentir-se perdido”, pensamento de Sören Kierkegaard, foi certamente o
sentimento dos que visitaram a videoinstalação Somewhere Over The
Rainbow — La Mer, 2005, com curadoria de Solange Farkas, que consistia
de imagens das águas do mar projetadas nas paredes dos 400m2 da sala
principal do Museu de Arte Moderna da Bahia, antigo engenho de açúcar do
século XVI, construído por escravos negros em cima da Baía de Todos os
Santos. Transitando em águas profundas do mundo criativo, do
inconsciente, Mario Cravo Neto produz uma obra e expressa a cultura de
sua terra. Este texto é apenas uma tentativa de síntese dessa
impressionante produção que, até o presente, gerou a edição de 14 livros
em diversos países; inúmeras matérias em jornais e revistas; mostras
individuais e coletivas no Brasil e no exterior; nove prêmios; a
participação em coleções de diversos museus; fazendo deste artista
referência em dezenas de publicações sobre fotografia, além da entrada
para a Encyclopédie Internationale des Photographes, Carole Naggar,
Édition de Seuil, Paris, 1982 e Encyclopédie Internationale des
Photographes, 1939-1984, Michel Auer, Editions Camera Obscura, Berne,
1984 e para o Dictionnaire Mondial de Photographie, Larousse, Paris,
1994.
Imerso no mundo mítico e na natureza de seu país, Mario Cravo Neto dá continuidade a sua atividade criativa.
Fonte: http://www.cravoneto.com.br/
Nenhum comentário:
Postar um comentário